Por Aristela de Freitas Zanona
O papel do sistema sensorial é frequentemente menosprezado nos protocolos de tratamento, no entanto, déficits sensoriais levam a redução no controle motore são importantes na predição de resultados de recuperação. De fato, pessoas sem capacidade suficiente para modulação sensorial geralmente usam força excessiva ou manipulação desajeitada ao executar tarefas do cotidiano.
Em nível de atividade e participação, a disfunção somatossensorial está associada a uma alta incidência de comprometimento funcional e segurança para realizar tarefas manuais. A alteração na função sensorial foi considerada como um forte preditor de incapacidades para desempenhar atividades de cuidados pessoais, retorno ao trabalho e atividades educacionais. Isto porque a falta de discriminação, percepção e destreza dificulta a execução de diversas atividades que exigem precisão, desde acertar o ritmo dos movimentos para escovação de dentes, até trabalhos minuciosos como escrever, costurar, operar máquinas, entre outros. A perda sensorial, mais especificamente da somatossensibilidade, tem um impacto negativo sobre a exploração segura do ambiente pelo paciente e sua participação em atividades da vida diária, bem como atividades de lazer.
Apesar das crescentes evidências de que a estimulação sensorial periférica e/ou cortical pode ser benéfica nas deficiências sensoriais/motoras incorrendo em melhora na participação em atividades do cotidiano, os terapeutas acabam utilizando protocolos não baseados em evidência científica e agindo de forma empírica no tratamento desse sistema tão importante per si e também adjuvante em outras funções corporais.
Tais métodos têm sido modernizados por abordagens mais sofisticadas utilizando por exemplo estimulação elétrica funcional (FES – – Limiar sensitivo); neuroestimulação elétrica transcutânea (TENS – Limiar sensitivo), terapia espelho, compressão pneumática intermitente, vibração e neuromodulação. Além disso, o treinamento sensorial ativo e protocolos dereeducação sensorial mais refinados, baseados em evidências científicas, mostraram-se mais eficazes do que os estímulos passivos sozinhos
Treinamento Sensorial Ativo
Os protocolos sensoriais podem ser divididos em Exteroceptivos ou proprioceptivos. O Treino Sensorial Ativo é uma proposta que visa a mudança de comportamento, baseada na aprendizagem perceptiva, consistente com a plasticidade neural “dependente da aprendizagem”. O protocolo é baseado em princípios de treinamento cognitivo para lidar com a discriminação de textura, senso de posição dos membros e reconhecimento tátil de objetos. Além disso, esses princípios são aplicados no contexto das tarefas funcionais dos membros superiores identificadas pelo paciente como impactados por sua imparidade somatossensorial
Estimulação Elétrica Transcutânea (TENS)
O aumento da entrada de estímulos somatossensoriais pode levar a plasticidade a longo prazo e aumentar a recuperação motora em pacientes com comprometimentos neurológicos. A estimulação elétrica transcutânea (TENS) é uma modalidade adicional que pode fornecer entrada sensorial pelo nervo periférico estimulado por eletrodos colocados na pele, ajustamento da intensidade da estimulação, que é alcançada principalmente por manipulação da duração do pulso, frequência do pulso e / ou amplitude da corrente. Isto resulta em recrutamento de fibras nervosas sensoriais de grande diâmetro e /ou mecanorreceptores sem criar contração muscular significativa. Embora a TENS sensorial seja frequentemente usada na reabilitação, principalmente para modulação da dor e espasticidade, houve um crescente interesse na década passada em seu uso como meio de melhorar a recuperação sensorial e motora.
Terapia Espelho
A Terapia espelho (TE), um método de reabilitação simples e barato, foi proposta como uma abordagem de reabilitação promissora para recuperação da função motora do membro superior em pacientes com disfunção neurológica. Foi proposto que a TE promove a função motora da extremidade superior em pacientes com AVC por meio da ativação do córtex motor primário (M1) cortex somatosensorial, o giro temporal, córtex pré-córneo, giro do cingulo e o giro occipital superior direito são facilitados durante a terapia.
Vibração Terapêutica
A vibração terapêutica tem sido exaustivamente estudada em diversos desfechos, tais como: Reduzir espasticidade; Aumentar a contração muscular; Melhorar marcha Aumentar a atenção na heminegligência; Facilitar as tarefas de controle motor. Contudo, as evidencias para uso desse recurso para melhorar a sensação tem sido destaque nos principais artigos da área. A vibração, especialmente nas intensidades entre 70 a 80 Hz podem promover ativação da atividade cortical em resposta a vibração não apenas no córtex somatossensorial, mas também no córtex motor, córtex pré-motor, e áreas motoras suplementares e cinguladas.
Compressão
As vestimentas de compressão (muito populares na pediatria) ou mesmo a compressão pneumática intermitente, também tem sido usadas para promover maior e melhor input sensorial aos membros superiores e inferiores. A pressão mecânica aplicada à superfície do corpo pode causar alterações na transmissão de feedback sensorial pela ativação de mecanorreceptores abaixo e em torno do local de compressão, alterando a excitabilidade reflexa e melhorando a precisão de alcance, especialmente em tarefas dinâmicas/ativas. O sistema sensorial precisa ser estudado e a prática da reeducação sensorial precisa ser incorporada em nossos ambientes terapêuticos. Assim, espero que este texto possa contribuir em despertar em você, leitor, a iniciativa de se capacitar, entender e atuar no processo de reeducação sensorial do seu paciente neurológico.
Referências:
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- de Freitas Zanona A, Romeiro da Silva AC, Baltar do Rego Maciel A, Shirahige Gomes do Nascimento L, Bezerra da Silva A, Piscitelli D, Monte-Silva K. Sensory and motor cortical excitability changes induced by rTMS and sensory stimulation in stroke: A randomized clinical trial. Front Neurosci. 2023 Jan 25;16:985754. doi: 10.3389/fnins.2022.985754.
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